Direito Administrativo

Município como Parte Integrante do Sistema Nacional de Trânsito

Município como Parte Integrante do Sistema Nacional de Trânsito

 

 

Ravênia Márcia de Oliveira Leite*

 

 

O Código de Trânsito Brasileiro e a legislação complementar em vigor vieram introduzir profundas mudanças no panorama institucional do setor. Para sua real implementação em todo o País, muito é preciso ainda investir, principalmente no que diz respeito à capacitação, fortalecimento e integração dos diversos órgãos e entidades executivos de trânsito, nas esferas federal, estadual e municipal, de forma a produzir efeito nacional, regional e local e buscando contribuir para a formação de uma rede de organizações que constituam, verdadeiramente, o Sistema Nacional de Trânsito.

 

O Código de Trânsito Brasileiro estabelece que o Sistema Nacional de Trânsito compõe-se de órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, estendendo até estes as competências executivas da gestão do trânsito.

 

O atendimento a algumas exigências é condição indispensável à integração de cada município ao Sistema Nacional de Trânsito. Tais exigências estão expressas no Código, artigos 24 e 333, e em Resolução do CONTRAN.

 

A integração do município ao Sistema Nacional de Trânsito independe de seu tamanho, receitas e quadro de pessoal. É exigida a criação do órgão de trânsito e da Junta Administrativa de Recursos de Infrações – JARI, à qual cabe julgar os recursos interpostos pelos presumidos infratores.

 

Atualmente, encontram-se integrados ao SNT, cerca de 620 Municípios, mas inúmeros outros encontram-se carentes de orientação e preparo para a introdução das mudanças exigidas. Para implantação das orientações legais relativas à municipalização do trânsito, torna-se importante validar e implantar princípios e modelos alternativos para estruturação e organização dos sistemas locais, passíveis de adequação às diferentes realidades da administração municipal no Brasil e viabilizar apoio técnico-legal e administrativo aos municípios que buscam engajar-se nesse movimento de mudança.

 

A gestão integrada do trânsito e do transporte local é mais um fator impulsionador da administração municipal eficaz já praticada nos municípios brasileiros.

 

Por fim, é necessário ter-se em mente a relação biunívoca do uso do solo com o trânsito e o transporte, pois cada edificação gera uma necessidade diferente de deslocamento, que deve ser atendida e, por outro lado, a movimentação de veículos, pessoas e animais interfere na implantação e utilização das edificações.

 

O Código de Trânsito Brasileiro, no melhor e mais equilibrado espírito federativo, prevê uma clara divisão de responsabilidades e uma sólida parceria entre órgãos federais, estaduais e municipais. Os municípios, em particular, tiveram sua esfera de competência substancialmente ampliada no tratamento das questões de trânsito. Aliás, nada mais justo se considerarmos que é nele que o cidadão efetivamente mora, trabalha e se movimenta, ali encontrando sua circunstância concreta e imediata de vida comunitária e expressão política.

 

Por isso, compete agora aos órgãos executivos municipais de trânsito exercer nada menos que vinte e uma atribuições. Uma vez preenchidos os requisitos para integração do município ao Sistema Nacional de Trânsito, ele assume a responsabilidade pelo planejamento, o projeto, a operação e a fiscalização, não apenas no perímetro urbano, mas também nas estradas municipais. A prefeitura passa a desempenhar tarefas de sinalização, fiscalização, aplicação de penalidades e educação de trânsito.

 

Para os municípios se integrarem ao Sistema Nacional de Trânsito, exercendo plenamente suas competências, precisam criar um órgão municipal executivo de trânsito, previsto no artigo 8º, do CTB e Resolução nº 106/99-CONTRAN, com estrutura para desenvolver atividades de engenharia de tráfego, fiscalização de trânsito, educação de trânsito e controle e análise de estatística. Conforme o porte do município, poderá ser reestruturada uma secretaria já existente, criando uma divisão ou coordenação de trânsito, um departamento, uma autarquia, de acordo com as necessidades e interesse do prefeito.

 

O art. 16, do Código de Trânsito Brasileiro, prever ainda que, junto a cada órgão de trânsito, deve funcionar a Junta Administrativa de Recursos de Infrações (JARI), órgão colegiado responsável pelo julgamento dos recursos interpostos contra penalidades impostas pelo órgão executivo de trânsito.

 

Para efetivar a integração do município ao Sistema Nacional de Trânsito, deverá ser encaminhado ao Denatran:

 

• A legislação de criação do órgão municipal executivo de trânsito com os serviços de engenharia do trânsito, educação para o trânsito, controle e análise de dados estatísticos e fiscalização;

• Legislação de criação da JARI e cópia do seu regimento interno;

• Ato de nomeação do dirigente máximo do órgão executivo de trânsito (autoridade de trânsito);

• Nomeação dos membros da JARI, conforme Resolução n.º 147/2003 e 175/2005;

• Endereço, telefone, e-mail, fax do órgão ou entidade executivo de trânsito e rodoviário.

 

Segundo o art. 24 do Código de Trânsito Brasileiro compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição:

 

I – cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de suas atribuições;

II – planejar, projetar, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de pedestres e de animais, e promover o desenvolvimento da circulação e da segurança de ciclistas;

III – implantar, manter e operar o sistema de sinalização, os dispositivos e os equipamentos de controle viário;

IV – coletar dados estatísticos e elaborar estudos sobre os acidentes de trânsito e suas causas;

V – estabelecer, em conjunto com os órgãos de polícia ostensiva de trânsito, as diretrizes para o policiamento ostensivo de trânsito;

VI – executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis, por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, no exercício regular do Poder de Polícia de Trânsito;

VII – aplicar as penalidades de advertência por escrito e multa, por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, notificando os infratores e arrecadando as multas que aplicar;

VIII – fiscalizar, autuar e aplicar as penalidades e medidas administrativas cabíveis relativas a infrações por excesso de peso, dimensões e lotação dos veículos, bem como notificar e arrecadar as multas que aplicar;

IX – fiscalizar o cumprimento da norma contida no art. 95, aplicando as penalidades e arrecadando as multas nele previstas;

X – implantar, manter e operar sistema de estacionamento rotativo pago nas vias;

XI – arrecadar valores provenientes de estada e remoção de veículos e objetos, e escolta de veículos de cargas superdimensionadas ou perigosas;

XII – credenciar os serviços de escolta, fiscalizar e adotar medidas de segurança relativas aos serviços de remoção de veículos, escolta e transporte de carga indivisível;

XIII – integrar-se a outros órgãos e entidades do Sistema Nacional de Trânsito para fins de arrecadação e compensação de multas impostas na área de sua competência, com vistas à unificação do licenciamento, à simplificação e à celeridade das transferências de veículos e de prontuários dos condutores de uma para outra unidade da Federação;

XIV – implantar as medidas da Política Nacional de Trânsito e do Programa Nacional de Trânsito;

XV – promover e participar de projetos e programas de educação e segurança de trânsito de acordo com as diretrizes estabelecidas pelo CONTRAN;

XVI – planejar e implantar medidas para redução da circulação de veículos e reorientação do tráfego, com o objetivo de diminuir a emissão global de poluentes;

XVII – registrar e licenciar, na forma da legislação, ciclomotores, veículos de tração e propulsão humana e de tração animal, fiscalizando, autuando, aplicando penalidades e arrecadando multas decorrentes de infrações;

XVIII – conceder autorização para conduzir veículos de propulsão humana e de tração animal;

XIX – articular-se com os demais órgãos do Sistema Nacional de Trânsito no Estado, sob coordenação do respectivo CETRAN;

XX – fiscalizar o nível de emissão de poluentes e ruído produzidos pelos veículos automotores ou pela sua carga, de acordo com o estabelecido no art. 66, além de dar apoio às ações específicas de órgão ambiental local, quando solicitado;

XXI – vistoriar veículos que necessitem de autorização especial para transitar e estabelecer os requisitos técnicos a serem observados para a circulação desses veículos.

§ 1º As competências relativas a órgão ou entidade municipal serão exercidas no Distrito Federal por seu órgão ou entidade executivos de trânsito.

§ 2º Para exercer as competências estabelecidas neste artigo, os Municípios deverão integrar-se ao Sistema Nacional de Trânsito, conforme previsto no art. 333 deste Código.

 

A Municipalização acarreta alguns vantagem como o aumento na arrecadação de multas é algo que chama a atenção dos gestores municipais quando resolvem municipalizar o trânsito. Ou seja, a cidade ter os próprios agentes de trânsito atuando nas infrações faz com que se tenha uma melhor fiscalização e conseqüentemente um ganho na emissão de multas, que até então era de responsabilidade do governo estadual.

 

Além disso, com as ações do setor de educação no trânsito, em pouco tempo os resultados começam a aparecer de forma positiva. O setor de engenharia de tráfego desenvolverá projetos para implementação de melhorias no sistema viário e estará constantemente avaliando os impactos negativos gerados pela urbanização da cidade, procurando encontrar soluções técnicas para minimizá-los. Este setor também é responsável pelos elementos que fazem parte da via, como a sinalização vertical (placas), horizontal (pinturas na via), semafórica, ondulações transversais (lombadas), redutores eletrônicos de velocidade (radares) e bloqueio de vias para realização de obras e eventos.

 

Deve-se citar algumas desvantagens da Municipalização, quais sejam, a criação de uma estrutura física para o gerenciamento do trânsito, pois exige pessoal qualificado e recursos de grande monta em fase inicial. Necessário também orietanção aos agentes de trânsito para que sejam evitados abusos na emissão de autos de infração.  Para a instalação de equipamentos para redução de velocidade, são necessários estudos de viabilidade técnica, pois caso isto não ocorra, o município poderá sofrer ações judiciais por parte dos condutores que se sentirem prejudicados.

 

Além disso, com o aumento na fiscalização de veículos e com as ações da educação no trânsito, a longo prazo diminuem-se o número de multas aplicadas, pois os condutores começam a respeitar mais as leis de trânsito.

 

Deve-se sempre estar atento a problemas que inevitavelmente ocorrerão e procurar minimizá-los através de ações preventivas, como o treinamento constante de sua equipe, trabalhos de orientação com condutores de veículos e campanhas educativas envolvendo a população da cidade.

 

A municipalização do trânsito, conforme prevê o Código de Trânsito Brasileiro, é um processo obrigatório que, em breve, todos os municípios terão que implementá-lo. Percebe-se, porém, que se trata de um programa audacioso, complexo e de grandes investimentos por parte dos municípios. Hoje, de acordo com DENATRAN (2007), dos 5.568 municípios existentes no Brasil, somente 850 estão com o seu trânsito municipalizado. Este baixo índice se deve a uma série de fatores, porém, dentre todos, os problemas de infra-estrutura urbana e dificuldades financeiras são os de maior ocorrência.

 

 

* Delegada de Polícia Civil em Minas Gerais. Bacharel em Direito e Administração – Universidade Federal de Uberlândia. Pós graduada em Direito Público – Universidade Potiguar. Pós-graduanda em Direito Penal – Universidade Gama Filho.

 

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Ravênia Márcia de Oliveira. Município como Parte Integrante do Sistema Nacional de Trânsito. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-administrativo/municipio-como-parte-integrante-do-sistema-nacional-de-transito/ Acesso em: 28 mar. 2024