Direito Administrativo

Concursos públicos honestos


A atual Constituição Federal estabelece que a
investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso
de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do
cargo ou emprego, na forma prevista em lei. (Artigo 37, inciso II).

A norma imperativa do concurso público não é um
preceito acidental ou fortuito, dentro da Constituição, mas expressa valores
éticos e jurídicos que a república deve consagrar.

Se a Constituição preceitua o concurso público,
para a entrada no serviço público, refere-se obviamente a concurso honesto.
Concurso desonesto não é concurso, mas falsidade, engano, mentira, ludibrio,
zombaria…

O ingresso no serviço público pela porta do
concurso honesto é extremamente benéfico para o conjunto da sociedade, como
tentaremos provar neste artigo.

Em primeiro lugar, os concursos sérios podem
selecionar os candidatos mais bem preparados. A escolha dos melhores
pretendentes para as vagas em disputa permite que a administração recrute
pessoas competentes que vão realizar seu trabalho com discernimento e
capacidade, o que não acontece quando o critério do mérito é substituído pelo
critério do favoritismo.

Em segundo lugar, aqueles que são aprovados em
concursos honestos não ficam devendo favor a ninguém. O preço desses favores,
em muitas situações, é justamente descumprir os deveres inerentes ao cargo,
servindo a interesses particulares escusos.

A terceira vantagem do concurso impoluto é o valor
ético desta forma de recrutamento, já que traduz idéias fundamentais de justiça
como igualdade de todos, sentido de cidadania, valor do estudo e do esforço,
serviço público de qualidade como direito social.

A quarta vantagem dos concursos limpos é a
contribuição que proporcionam para o avanço educacional do povo. Quem está
convencido de que presta um concurso realizado dentro de padrões de seriedade
estudará muito para esse concurso. O ato de prestar um concurso é sempre
oportunidade de crescimento intelectual, aprimoramento espiritual,
aprendizagem. Nenhum jovem perde seu tempo fazendo concursos quando estes estão
isentos de burla.

A quinta vantagem dos concursos sem falcatruas é a
lição que tais concursos ministram aos jovens, pois que instilam, na alma
deles, a crença na retidão e desestimulam a opção pelo caminho da fraude como
forma de vencer na vida.

A sexta vantagem dos concursos sem traficância é de
natureza psicológica. Faz bem ao espírito buscar oportunidades pela rota do
bem, e não pelos tranvios das maracutaias.

Concursos sujos, com cartas marcadas, para proteger
afilhados e parentes é deslavada forma de corrupção. Entretanto, com
freqüencia, tem-se a falsa idéia de que isto é somente uma irregularidade
porque corrupção é apenas tirar dinheiro dos cofres públicos, receber favores
ou valores para trair deveres de ofício etc.

Eu diria que concursos ardilosos, infames, com
cartas passadas debaixo da mesa prejudicam muito mais a coletividade do que
eventuais investidas contra os cofres públicos. Os ataques ao erário podem ser
estimados num valor financeiro determinado, ainda que esse valor seja às vezes
muito alto. A entrada no serviço público pelos corredores do nepotismo traz
maleficios muito superiores a qualquer cifra financeira, pois retira dos
jovens, principalmente os desprotegidos, a esperança na conquista digna do
futuro, introduz em cargos, mesmo vitalícios, pessoas despreparadas para o
respectivo exercício e destroça a máquina pública.

Ainda que não tenhamos poder para corrigir todos os
desmandos que ocorrem pelo Brasil afora, tenhamos pelo menos coragem para
utilizar, com independência, a palavra, este dom que Deus deu aos homens e
recusou aos animais, e com a palavra proclamar em alto e bom som, com todas as
letras: concurso público desonesto é ato de indiscutível corrupção, quem
promove concurso público desonesto é corrupto.

A palavra, por si só, não repõe a Ética no lugar
que lhe cabe, mas é através da denúncia que se inicia o combate. Esse combate
não tem possibilidade de êxito se for travado solitariamente. Demanda união,
ações coletivas dos prejudicados com vistas a impugnar concursos maculados com o
estigma do pistolão.

João Baptista Herkenhoff é professor pesquisador da
Faculdade Estácio de Sá de Vila Velha (ES), palestrante Brasil afora e
escritor. Autor do livro Mulheres no banco dos réus – o universo feminine sob o
olhar de um juiz (Editora Forense, Rio).

E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br

Homepage: www.jbherkenhoff.com.br

Como citar e referenciar este artigo:
HERKENHOFF, João Baptista. Concursos públicos honestos. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2011. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-administrativo/concursos-publicos-honestos/ Acesso em: 29 mar. 2024