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O conselheiro do crime

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Vim de ver o filme de Ridley Scott, O Conselheiro do Crime, baseado em roteiro original de Comarc MacCarthy, autor que foi apresentado ao cinema pelos Irmãos Cohen no magnífico Quando os Fracos Não Têm Vez. Juntos, um grande diretor e um grande escritor não poderiam produzir algo ruim. Eu gostei muito do filme.

O tema predileto de MacCarthy foi abordado: o mal. Quem leu os livros dele sabe que o homem não economiza. Sua visão é estóica: nada faz sentido nessa vida, a violência é intrínseca aos homens e não há redenção, quase poderíamos pensar os homens como mônadas na roda do destino. Ao homem sábio cabe acatar as fatalidade como algo inevitável e intrínseco. E o eterno retorno do mesmo, regado pela violência.  Nesse roteiro MacCarthy sublinha o amor entre o homem e a mulher, mas não como forma de redenção, antes como instrumento para elevar o sofrimento dos que amam. O amor seria pura ilusão.

Ridley Scott narrou o roteiro de forma lenta, quase metade do filme sem nenhuma cena de ação. Quase uma historinha de amor. Talvez por isso a crítica ligeira tenha falado mal do filme. Uma injustiça. A narrativa soft de Scott pareceu-me um contraponto adequado para as cenas de extrema violência que são o epílogo do filme.

O elo da história é o Counselor (vivido magnificamente por Michael Fassbender), um advogado que se envolve com o crime e que ama perdidamente a mulher Laura (Penélope Cruz), por quem daria a vida. Não pôde fazê-lo porque ela foi assassinada exatamente para lhe provocar o máximo sofrimento, sendo sugerido no roteiro que a morte só veio depois de sevícias e bárbaras torturas, filmadas e lhe enviadas em cd.

Outro personagem importante é vivido por Javier Bardem, Reiner, que ama de paixão Malkina (Penélope Cruz).  Esses personagens terão destinos diferentes do outro casal.

A loira e a morena no auge da beleza madura são um detalhe muito importante na história. Ambas amam e são amadas, mas Laura é católica e Malkina é ateia. A religião é abordada de relance, como se o roteirista quisesse mostrar que ela não tem relevância para o drama de violência e morte que é a constante da existência do homem, desde a noite original. Dinheiro, poder e sexo, nada mais é o móvel dos homens e mulheres.

Da mesma forma, o Estado é ausente, só aparece na cena da prisioneira. Nem precisava aparecer: o crime tem sido a metáfora perfeita para se fazer a crônica do Estado. É o Estado ele mesmo. Quem falha, paga.

Também Bradd Pitty aparece no maladrão Westray, que acaba sendo morto em Londres de forma assaz original, macabra. Bradd Pitty tem criados tipos e nesse personagem também o faz. Gostei da sua atuação.

Os instantes de violência queimam os personagens por dentro como uma vela queima por fora. O produto da combustão é uma placa que entope o coração, seja dos mais fracos, que sucumbem, seja dos mais fortes, que choram. O Counselor chora a morte da amada e a sua impotência para salvá-la provada emoção. A vela exauriu-se.

Eu me divirto com a literatura de Comac  MacCarty, grande escritor que é, mas sei que ele está profundamente errado. O estoicismo é um grave erro. Eu sei que a vida tem um sentido e que a revelação cristã é que dá o sentido.  Mas, de qualquer forma, MacCarthy tem o poder de nos levar a meditar sobre o mal. Está errado, mas é bom dialogar intimamente com alguém que pensou tão profundamente sobre o assunto.

Como citar e referenciar este artigo:
CORDEIRO, Nivaldo. O conselheiro do crime. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2013. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/conhecimento-artigos/o-conselheiro-do-crime/ Acesso em: 25 abr. 2024